O que a COP30 tem a ver com a sua saúde?

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Quando você ouve falar em COP30, talvez pense em ursos polares, geleiras derretendo ou políticos em reuniões intermináveis. Mas e se eu te dissesse que essa conferência do clima tem tudo a ver com aquela tosse persistente do seu filho, com o surto de dengue no seu bairro ou até com aquele dia em que você quase desmaiou de calor no ponto de ônibus?

De fato, a crise climática não é um problema distante — ela já está batendo à porta dos serviços de saúde.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mudanças climáticas já provocam cerca de 250 mil mortes adicionais por ano no mundo, consequência de estresse térmico, desnutrição e doenças infecciosas.¹ É um alerta global: o clima em transformação não ameaça apenas ecossistemas, mas a sobrevivência humana.

Quando o termômetro sobe, a saúde desce

Lembra daquele verão insuportável do ano passado? Não foi impressão: as ondas de calor estão mais frequentes, intensas e prolongadas, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).² E os efeitos vão muito além do desconforto. Hospitais registram picos de atendimento por desidratação, exaustão térmica, crises cardíacas e até mortes em dias de calor extremo. Idosos, crianças e trabalhadores expostos ao sol estão entre os mais vulneráveis.

O calor também agrava doenças crônicas, como hipertensão e diabetes. Mesmo pequenas variações de temperatura têm impacto. Um estudo publicado no Environmental Research (2022), conduzido pela Universidade do Havaí, mostra que cada aumento de um grau Celsius eleva em cerca de 4% o risco de morte por causas cardiovasculares em idosos.³ Outro levantamento da The Lancet Planetary Health (2023) confirmou que as ondas de calor estão associadas ao aumento de internações respiratórias e descompensações cardíacas em grandes cidades.⁴

O mosquito está adorando o aquecimento global

Sabe aquela dengue que virou epidemia? O clima tem tudo a ver com isso. Temperaturas mais altas e períodos de chuva desregulados criam o ambiente perfeito para o Aedes aegypti — mosquito que transmite dengue, zika e chikungunya — se reproduzir e sobreviver por mais tempo.

Relatórios da Organização Pan-Americana da Saúde mostram que o Brasil registrou recordes históricos de casos de dengue em 2024, e a tendência é de alta com o avanço do aquecimento global.⁵
E não é só a dengue: doenças como malária e febre Oeste do Nilo estão se expandindo para regiões onde nunca circularam. Um estudo do New England Journal of Medicine (2022) aponta que o aumento da temperatura média global pode favorecer surtos de malária em áreas antes consideradas livres do parasita.⁶ O IPCC reforça que as doenças transmitidas por vetores estão entre os principais impactos de saúde pública previstos para as próximas décadas.²

Pulmões sob ataque

As queimadas na Amazônia não ficam restritas à floresta. Pesquisas da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que a fumaça de grandes incêndios pode viajar milhares de quilômetros, alcançando o Sudeste e até países vizinhos.⁷ Em 2023, o ar em São Paulo atingiu índices de poluição comparáveis aos de megacidades asiáticas, segundo o Inpe e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb).⁸

A poluição do ar, agravada pelas mudanças climáticas, é uma das maiores ameaças à saúde global, segundo a OMS. Está associada a doenças respiratórias, cardiovasculares e até a casos de câncer de pulmão.⁹ Crianças expostas ao ar poluído desde cedo têm maior risco de desenvolver asma e bronquite crônica, como confirma estudo do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.¹⁰

O calor atmosférico — não o das queimadas — também agrava o problema. Temperaturas elevadas aumentam a formação de ozônio e de partículas finas (micropoluentes invisíveis), tornando o ar ainda mais tóxico.¹¹

Enchentes trazem mais do que prejuízos materiais

Quando a chuva é intensa demais, chegam as enchentes — e com elas uma série de doenças. A água contaminada espalha leptospirose, hepatite A, diarreias e infecções de pele. A OMS alerta que eventos extremos, como inundações, estão entre as principais causas de surtos em áreas urbanas, especialmente nas regiões tropicais.¹

Além dos riscos físicos, há o impacto psicológico. Perder a casa, viver em abrigos improvisados e lidar com perdas sucessivas provoca sofrimento duradouro. Estudos da Fiocruz mostram que pessoas expostas a desastres climáticos têm até cinco vezes mais chances de desenvolver sintomas de ansiedade e depressão.¹²

Comida na mesa (ou a falta dela)

Secas prolongadas, enchentes repentinas e pragas agrícolas que migram para novas regiões afetam diretamente a produção e o preço dos alimentos. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) alerta que, em 2024, mais de 30 países já enfrentavam algum nível de insegurança alimentar em razão do clima.¹³
Isso acontece porque o calor e a irregularidade das chuvas prejudicam o crescimento das lavouras, reduzem a produtividade do solo e alteram o ciclo de culturas essenciais como arroz, trigo e milho.

Além da escassez, há perda de qualidade nutricional. Pesquisadores da Annual Review of Nutrition (2024) mostraram que o aumento da concentração de dióxido de carbono (CO₂) — o principal gás de efeito estufa — reduz o teor de proteínas e minerais em grãos e hortaliças, comprometendo a nutrição humana.¹⁴
O resultado é claro: mais fome, mais vulnerabilidade e mais doenças relacionadas à desnutrição e à baixa imunidade.

E a nossa cabeça nisso tudo?

As mudanças climáticas também mexem com a mente. O termo “ecoansiedade” é reconhecido pela Associação Americana de Psicologia para descrever o medo persistente do futuro e a sensação de impotência diante das transformações ambientais.¹⁵
O impacto emocional de desastres, perdas e deslocamentos forçados por secas ou enchentes causa aumento expressivo de depressão, ansiedade e insônia — efeitos já observados em estudos conduzidos pela Fiocruz e pelo Ministério da Saúde após as enchentes no Sul do país, em 2024.¹⁶

Por que a COP30 importa, então?

É na COP30 que governos de todo o mundo vão decidir como — e com que urgência — enfrentar o aquecimento global. Cada décimo de grau evitado representa vidas salvas, menos internações e mais qualidade de vida.

A conferência será realizada em Belém, no coração da Amazônia — um lembrete de que a floresta não é apenas um cartão-postal: ela regula o clima, influencia as chuvas e filtra o ar que respiramos. Proteger a Amazônia é proteger a saúde de milhões de brasileiros — inclusive a sua.

A crise climática é, antes de tudo, uma crise de saúde pública. E quanto mais cedo entendermos isso, mais vidas serão salvas.

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  1. World Health Organization. Climate Change and Health – Fact Sheet (2023). https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/climate-change-and-health
  2. IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change. AR6 WGII, Human Health Chapter (2022). https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg2/
  3. Mora C et al. Environmental Research 2022; 212:113307. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35709806/
  4. Gasparrini A et al. The Lancet Planetary Health 2023; 7(5):e370–e382. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37000782/
  5. Organização Pan-Americana da Saúde. Boletim Epidemiológico de Arboviroses (2024). https://www.paho.org/pt
  6. Ryan SJ et al. New England Journal of Medicine 2022; 386:e25. https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMra2200092
  7. Artaxo P et al. Universidade de São Paulo / Inpe (2023). Dispersão de material particulado de queimadas na Amazônia. https://www.inpe.br
  8. Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Boletim de Qualidade do Ar – Região Metropolitana de São Paulo (2023). https://cetesb.sp.gov.br/ar/
  9. Pinho-Gomes AC et al. The Lancet Planetary Health 2023; 7(9):e789–e797. https://www.thelancet.com/journals/lanplh/article/PIIS2542-5196(23)00189-4/fulltext
  10. Centers for Disease Control and Prevention. Air Pollution and Health (2024). https://www.cdc.gov/climate-health/php/effects/air-pollution.html
  11. WHO / UNEP. Air Quality and Climate Change Interactions (2022). https://wedocs.unep.org
  12. Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Saúde Mental e Desastres Climáticos (2024). https://portal.fiocruz.br
  13. FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations. Food Security and Nutrition under Climate Change (2024). https://www.fao.org
  14. Fanzo J et al. Annual Review of Nutrition 2024; 44:221–239. https://www.annualreviews.org/content/journals/10.1146/annurev-nutr-111324-111252
  15. Clayton S et al. American Psychological Association – Eco-Anxiety Report (2023). https://www.apa.org/news/press/releases/ecoanxiety
  16. Ministério da Saúde / Fiocruz. Relatório sobre Impactos Psicossociais das Enchentes no Sul (2024). https://www.gov.br/saude

Deborah Lima

Jornalista do Saúde a Sério

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