Anvisa aprova vorasidenibe, para gliomas de baixo grau

Registro inédito no país alinha o Brasil às abordagens mais recentes no manejo de tumores cerebrais

Tempo de Leitura: 4 minutos

O vorasidenibe, medicamento oral em comprimidos indicado para gliomas difusos de baixo grau com mutação em IDH, teve o registro aprovado no Brasil. A decisão da Anvisa foi publicada em 11 de agosto de 2025 e oficializa a disponibilidade do fármaco no país. No cenário regulatório internacional, a Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, concedeu aprovação em 6 de agosto de 2024 para adultos e adolescentes de 12 anos ou mais com astrocitoma, ou oligodendroglioma de grau 2 com mutação suscetível em IDH1 ou IDH2, após cirurgia; segundo a agência, foi a primeira aprovação de uma terapia sistêmica para essa população específica¹. Desenvolvido pela Servier, o vorasidenibe é um inibidor oral que atua bloqueando seletivamente as formas mutantes de IDH1 e IDH2, reduzindo a produção anômala de um oncometabólito chamado 2-hidroxiglutarato, substância associada à progressão tumoral por reprogramação metabólica². O fármaco é ativo no sistema nervoso central e reduz níveis de D-2-hidroxiglutarato (D-2HG), o oncometabólito característico dos tumores IDH-mutantes²,³.

Gliomas difusos de baixo grau, na classificação contemporânea, são tumores infiltrativos do sistema nervoso central, de evolução mais lenta, mas com potencial de progressão. Incluem, orientados por biomarcadores, o astrocitoma IDH-mutante e o oligodendroglioma IDH-mutante com codeleção 1p/19q (perda concomitante dos braços cromossômicos 1p e 19q), ambos grau 2 no espectro dos gliomas difusos. Essa definição segue diretrizes europeias baseadas na classificação da OMS de 2021⁴.

Na prática clínica, a conduta busca equilibrar controle oncológico e preservação funcional, com ressecção máxima segura quando possível e decisão sobre terapias adjuvantes conforme o risco individual⁴. Em contexto de adoção de terapias direcionadas, a confirmação do status de IDH por método validado torna-se um passo central na definição do plano terapêutico⁴.

Evidência clínica e impacto no tratamento
A eficácia do vorasidenibe foi avaliada no estudo de fase 3 INDIGO (NCT04164901)¹, e a bula norte-americana descreve os resultados clínicos que sustentam a aprovação². Conduzido por Ingo K. Mellinghoff (neuro-oncologista; chair de Neurologia do Memorial Sloan Kettering Cancer Center), o ensaio demonstrou que a sobrevida livre de progressão foi de 27,7 meses com vorasidenibe e de 11,1 meses com placebo (HR [razão de risco] 0,39; IC95% [intervalo de confiança de 95%] 0,27–0,56; p<0,001)³. O medicamento também adiou a necessidade de nova intervenção (HR 0,26; IC95% 0,15–0,43)³. A população do INDIGO incluiu pacientes pós-cirurgia, sem radioterapia e quimioterapia prévias e sem necessidade imediata de tratamento citotóxico, cenário que reforça a estratégia de postergar radioterapia e quimioterapia quando clinicamente apropriado³.

Quanto à segurança, os eventos adversos de grau 3 ou maior ocorreram em cerca de um quinto dos participantes que receberam o fármaco. O evento de interesse especial mais notável foi o aumento da ALT (alanina aminotransferase), com aproximadamente 10% dos pacientes apresentando alterações de grau 3 ou maior³. Conforme a bula norte-americana, recomenda-se monitorização periódica de enzimas hepáticas — AST (aspartato aminotransferase), ALT (alanina aminotransferase), GGT (gama-glutamiltransferase) — além de bilirrubina total e fosfatase alcalina, com manejo por suspensão temporária, redução de dose ou descontinuação, conforme a gravidade².

Tratamento de gliomas
Historicamente, o manejo dos gliomas difusos de baixo grau combina a máxima ressecção cirúrgica segura, vigilância ativa em casos selecionados e terapias adjuvantes conforme o risco⁴. Para pacientes de maior risco, a associação de radioterapia à quimioterapia clássica com procarbazina, lomustina (CCNU) e vincristina (PCV) demonstrou ganho de sobrevida no ensaio RTOG 9802, liderado por Jan C. Buckner (oncologista; Mayo Clinic)⁵. Outra referência é o EORTC 22033-26033, conduzido por Brigitta G. Baumert (radio-oncologista; Kantonsspital Graubünden), que comparou temozolomida em monoterapia versus radioterapia em glioma de baixo grau de alto risco e não mostrou diferença global de sobrevida livre de progressão entre as estratégias, ressaltando a influência dos perfis moleculares na decisão terapêutica⁶.

No Brasil, estimam-se cerca de 11.490 casos novos por ano de tumores do sistema nervoso central no triênio 2023–2025 (6.110 em homens e 5.380 em mulheres), categoria que inclui os gliomas; as estatísticas nacionais não discriminam rotineiramente por grau histológico, de modo que os gliomas difusos de baixo grau representam uma fração desse total⁷.

O registro do vorasidenibe representa a chegada, no país, de uma terapia direcionada para gliomas grau 2 com mutação em IDH, com benefício clínico demonstrado no INDIGO e potencial de reorganizar a sequência terapêutica para uma parte dos pacientes. Para a prática, os próximos passos incluem confirmar o status de IDH por método validado, discutir o sequenciamento com radioterapia e quimioterapia em tumor board (comitê multidisciplinar) à luz do risco individual e adotar a vigilância laboratorial hepática recomendada até a publicação da bula brasileira. A adoção ampla dependerá também de avaliações de incorporação e acesso nos sistemas público e privado, além da disponibilização comercial.

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  1. FDA — FDA approves vorasidenib for Grade 2 astrocytoma or oligodendroglioma with a susceptible IDH1 or IDH2 mutation (06/08/2024). Disponível em: https://www.fda.gov/drugs/resources-information-approved-drugs/fda-approves-vorasidenib-grade-2-astrocytoma-or-oligodendroglioma-susceptible-idh1-or-idh2-mutation
  2. FDA label — vorasidenib tablets, for oral use (PDF). Disponível em: https://www.accessdata.fda.gov/drugsatfda_docs/label/2024/218784s000lbl.pdf
  3. Mellinghoff IK (neuro-oncologista; chair de Neurologia, Memorial Sloan Kettering Cancer Center), et al. Vorasidenib in IDH1- or IDH2-Mutant Low-Grade Glioma (INDIGO). New England Journal of Medicine, 2023. Disponível em: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2304194
  4. Weller M (neurologista e neuro-oncologista; University Hospital Zurich), et al. EANO guidelines on the diagnosis and treatment of diffuse gliomas of adulthood. Nature Reviews Clinical Oncology, 2021. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41571-020-00447-z
  5. Buckner JC (oncologista; Mayo Clinic), et al. Radiation plus Procarbazine, CCNU, and Vincristine in Low-Grade Glioma (RTOG 9802). New England Journal of Medicine, 2016. Disponível em: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1500925
  6. Baumert BG (radio-oncologista; Kantonsspital Graubünden), et al. Temozolomide chemotherapy versus radiotherapy in high-risk low-grade glioma (EORTC 22033-26033). The Lancet Oncology, 2016. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lanonc/article/PIIS1470-2045%2816%2930313-8/fulltext
  7. INCA — Estimativa dos casos novos no Brasil, 2023–2025 (tumores do sistema nervoso central). Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/numeros/estimativa/estado-capital/brasil

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Deborah Lima

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